Diário das Magrelas: De férias e de bicicleta em Florianópolis-SC
De férias da redação do Bike é Legal, fui até a ilha da magia passar alguns dias de descanso, mas também de muito pedal. Na matéria, você confere as percepções de uma paulistana na cidade de Florianópolis-SC.
Bikerrepórter quando entra de férias continua só querendo saber de pedalar. Não seria diferente comigo, que desembarquei em Florianópolis-SC com uma bike a minha espera. Isso porque, dessa vez viajei de avião, e embarcar a bicicleta é um pouco mais complicado do que levar ela no ônibus. Em minha última experiência com a cia Catarinense, pude despachar a magrela sem nem tirar as rodas.
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Senti falta da minha híbrida Clara, mas a mountain bike que me emprestaram deu conta do recado, apesar do quadro ser quase três números menor do que o ideal para meu tamanho. Tentei compensar com a altura do selim, mas a dirigibilidade da bike diminui bastante, e por isso é tão importante ter uma bicicleta sob medida para o dia a dia.
A ilha da magia nos meus três primeiros dias de viagem estava cinza; garoa fina intercalada de pancadas mais fortes de chuva. Nada de preguiça! Saímos para pedalar mesmo assim, e aqui cabe as dicas do Bike é Legal de como pedalar com segurança em dias chuvosos.
Para começar bem a semana, São Pedro deu um desconto e Floripa amanheceu azul. Sai de casa e me lembrei o porquê me encantei tanto com essa cidade quando a visitei pela primeira vez; na ocasião, cobrindo a 2ª edição do 100gurias100medo, nem uma gotinha de chuva atrapalhou o rolê. Fato é que Florianópolis é impressionantemente bela, as montanhas que cercam a cidade são de tirar o fôlego, e mal sabia eu que realmente tirariam o meu no dia seguinte.
Uma amiga me convidou para um pedal fora da ilha, iriamos de carro até a entrada da cidade de Governador Celso Ramos e então “dale, dale” pedalar forte, e em zigue-zague nas horas mais críticas em que descer da bicicleta não é uma opção. Fora de brincadeira, foram menos de 35 quilômetros, só que com mais de 1.300 metros de altimetria acumulada, o que para mim foi algo inédito!
A estrada que dá volta nas montanhas da cidade é um sonho, não só pelo asfalto de qualidade, mas principalmente pelo baixíssimo fluxo de carros, o que nos permitiu um treino mais tranquilo e contemplativo. Cada subida conquistada era uma bateria de fotos para registrar as belezas do lugar e também o feito em cima da bicicleta.
Mas engana-se quem pensa que nas ruas da cidade de Florianópolis é assim tão fácil pedalar. Florianópolis ainda pulsa com os motores. As ruas que cortam a cidade têm uma velocidade média de quase 80km/h, e isso se reflete no comportamento dos ciclistas que raramente têm coragem de ocupar a pista da direta; pedalam forte quase nas guias da rua. Encarar uma fina com essa velocidade é muito mais assustador e perigoso.
Outro sintoma dessa ‘carrocracia’ é a ausência de faixas exclusivas de ônibus, a bela e congestionada Av. Beira Mar Norte que conecta grande parte da cidade se vê nos horários de pico travada, com os veículos coletivos ilhados entre um mar de carros privados. Mas nessa avenida há uma linda ciclovia, e ai é a velha história de sempre: os ciclistas passam voando e admirando a orla, enquanto motoristas agitam-se em impaciência.
A parte dessa ciclovia segregada e de alguns outros poucos quilômetros exclusivos para os ciclistas, Florianópolis carece de estruturas cicloviárias. A caminho da Praia do Campeche, Zona Sul da ilha, uma calçada compartilhada foi apelidada de ‘ciclofarsa’, tamanha a falta de manutenção da estrutura. Quero aqui ponderar que o incentivo à mobilidade por bicicleta através de estruturas segregadas poderia aumentar ainda mais o já impressionante número de 21% de mulheres entre o total de ciclistas. Em São Paulo essa média é de apenas 6%.
Tal foi a minha impaciência dentro do ônibus quando voltava da Praia Mole, Zona Leste da ilha, que quando fui perguntar em que altura estávamos para o cobrador, fiz isso com a má educação que a agitação de São Paulo alimenta. Segue o diálogo:
- Moço, quanto falta para chegarmos no Mercado Público?
- Olá, boa noite, como vai você? É a próxima parada já, mocinha.
Sim, achei os cidadãos de Florianópolis um cadinho mais educados do que nós paulistanos. Outro exemplo disso são os terminais de ônibus que tem uma integração baseada na confiança. Se você pagou uma passagem entrando no seu terminal de origem, não precisa pagar quando conectar com outro; é só entrar no segundo ônibus. Mas isso tudo acontece quase sem vigilância, vai da cidadania de cada um.
Algumas ruas movimentadas do centro também dispensam os semáforos na esperança do bom senso dos motoristas, e muitas vezes os condutores param quando avistam pedestres. Mas acho isso um tanto contraditório, com altos limites de velocidade, independente do bom senso do motorista, as vezes o tempo de frenagem não permite esse trânsito calma. O ideal seriam limites bem menores, ao menos nessas áreas.
Se existe alguma conclusão para esse texto, resgataria um trecho dessa coluna quando escrevi sobre a cidade de Santos-SP: “A cultura carrocêntrica está poluindo a cidade, fazendo as pessoas viverem dentro dos seus carros em constantes engarrafamentos nos horários de pico, esquecendo que sua cidade cresce frente à melhor “avenida” que pode existir, uma ciclovia em frente à praia.”. Como em Santos, e em quase todas as cidades brasileiras, Florianópolis é dividida entre os que aceleram seus carros, e os que limpam a cidade, e vivem a cidade, em cima de uma bicicleta.