Dos 400 km propostos a serem pedalados pelo Jalapão, só girei 125 e por um bom motivo
As belezas naturais são lindíssimas e demandam equipamentos de peso para serem documentadas. Câmeras compactas e leves nas mãos nada resolvem.
As belezas naturais são lindíssimas e demandam equipamentos de peso para serem documentadas. Câmeras compactas e leves nas mãos nada resolvem. O trabalho demanda tripés pesados, teleobjetivas de calado, baterias, filtros, chips e principalmente tempo.
As distâncias são gigantescas, assim como os deslocamentos, portanto, em vez de nos divertirmos e pedalar, preferimos Felipe Meireles e eu priorizar o trabalho.
O fotógrafo Alexandre Cappi, grande parceiro de outras aventuras e Felipe Gil da revista Gol estavam conosco e aderiram a mesma estratégia.
Saímos de Palmas direto por asfalto a Ponte Alta, cidadezinha distante uns 200 km.
Montamos as bicicletas e as 8:15h da manhã seguinte partimos para a primeira jornada . 90 km com 1.110 metros de subidas acumuladas, divididos em uma primeira perna de 60 km, até o Rio Vermelho, com passagem pela cachoeira do Sussuapara, e dali até a até a “Pousada do Jalapão” (pousada entre mil aspas), que fica 9 km antes da Cachoeira da Velha.
Nesse primero e único dia de pedal que eu encarei com a galera, deu para sentir que pedalar no Jalapão não é para iniciantes. Não digo iniciantes no pedal, mas iniciantes na aventura outdoor. Tem que ter um espírito livre superior.
A trilha é 100% do tempo em uma linha reta infinita, nada plana, que vara o cerrado. O piso original é areia, mas a estrada é de terra com cascalho e por vezes com poças traiçoeiras de areia.
O ciclista tem que sublimar o psicológico, para evitar o diálogo com os demônios. Valeu-me a agradável companhia de Charles Sampaio de Macapá.
A cachoeira de Sussuapara é lindíssima. Um cânion estreito, com toques de boca de caverna em Mata Atlântica, plotada dentro de um cerrado de esplêndida diversidade.
Ficar poucos minutos por lá doeu.
O calor dos primeiros 60 km me desidratou de tal forma que eu cheguei em trapos para o almoço. Faltou-me – como sempre – beber água. Ter uma mochila de hidratação facilitaria o hábito de ingerir a cada 10 minutos, mas esse peso nas costas eu há tempos não carrego. Essa é a chave para um pedal confortável sem as subsequentes dores nas costas. Não carregar nada no corpo.
Em suma eu até tinha água nas caramanholas, mas pegar a garrafa e beber é um hábito que não tenho. Sempre parece “perder tempo”. Um erro que eu paguei mais uma vez caro.
Depois do almoço, já recuperada, caiu aquela tempestade e foi aí que eu me dei bem.
Os cabos da Caloi Elite 30 são inteiriços, portanto a lama pouco afeta o funcionamento das marchas. Já os freios a disco sofreram e muito.
Mas para quem tem o espírito de “quanto pior melhor” essa segunda parte que detonou a muitos, para mim foi a mais tranquila.
Os equipamentos de filmagem, deixamos no carro. Estes sim morrem na chuva.
As 17:30 chegamos a “Pousada do Jalapão”, segundo relatos, uma antiga refinaria de cocaína que pertencia a Pablo Escobar, desmontada na época da criação do estado de Tocantins. Belo local.
Na manhã do segundo dia, fomos resgatados por Maria Amélia Castro Alves, produtora de vídeos, que seguiu o resto da viagem conosco dando o total suporte.
Dia seguinte, já em autos, sob a direção e produção de Maria Amélia, fomos a Cachoeira da Velha e seguimos a turma que pedalou 60 km até a entrada das Dunas, já no Parque Estadual do Jalapão em Mateiros.
RENATA FALZONI
Terceiro dia foi a vez dos Fervedouros de Mateiros, lagos onde a água brota filtrada por areia de dentro da terra com tal pressão que massageia o banhista, seguido de visitação a Mumbuca, a pequena comunidade das artesãs do Capim Dourado.
Já a noite, Fel Meireles, Felipe Gil, Geraldo Luiz de Freitas Barros, Alexandre Cappi, Ricardo e Ganzé, ambos de Brasília, apoiados pela luz do veículo de Amélia, rodamos 35 km no escuro, em um pedal dos mais divertidos de minha vida. Média de 16,6 km/h, 300 m de desnível, com uma velô máxima de 66 km/h, sempre com a possibilidade de sobrar na areia fofa.
Quarto dia sob tempestade não conseguimos filmar a Cachoeira do Formiga. Um descolamento de 80 km até a RPPN da Catedral do Jalapão, aos pés da rocha de mesmo nome.
Quinto dia um divertido rafting no Rio do Sono a seguir o fechamento de ouro: um rápido e muito técnico pedal pelos 2,5 km do Bike Park da Catedral.
Jalapão é um destino muito diferente de tudo o que se pode imaginar. Há que se despojar de conceitos pré concebidos para descrevê-lo e é injusto comparar.
Nos posts seguintes do Bike é Legal teremos uma série de reportagens a respeito de todas essas aventuras que eu relatei nesse texto, no entanto ficaremos devendo mostrar o que é estar dentro do cerrado, um bioma por demais de desrespeitado aqui no Brasil.
A diversidade, o verde dessa época do ano, os insetos entre eles mosquitos bem abusados, o piso arenoso, as cores, os caules enrugados e enegrecidos pelas queimadas, os buritis, as veredas, enfim, fui, fiquei, voltei e certamente não entendi nada.
Tenho que voltar.