No Afeganistão, professor pedala para levar livros a crianças em zona de guerra
Nesses lugares, as escolas foram varridas pelas explosões da guerra e as poucas que restaram ficam a horas de viagens das comunidades. O resultado é uma taxa de alfabetização muito baixa
Em meio a guerra, as crianças afegãs são afastadas das escolas pela dificuldades impostas pelo cenário de horror no pais. Chegar até uma sala de aula é quase impossível, mais ainda para os moradores das regiões mais afastadas dos centros urbanos.
Um anjo de bicicleta chamado Saber Hosseini resolveu distribuir livros infantis entre os pequenos que ainda mal sabem ler e ele faz isso com sua singela bicicleta, equipada com um caixote que carrega dentro de si a possibilidade de um futuro melhor.
Em entrevista ao portal internacional do MSN, o professor escolar disse que consegue ver nos olhos das centenas de crianças que recebem seus livros uma excitação e felicidade sem tamanho. “Quando chego com os livros posso ver nos olhos deles a excitação necessária para o aprendizado e isso também me inspira.”, comenta Hosseini.
Durante a semana, Saber Hosseini dá aulas na capital de Bamyan, uma província no centro do Afeganistão. Mas durante seu tempo livre, aos feriados e finais de semana, Hosseini pedala quilômetros montanha acima para alcançar as regiões devastadas pela guerra e levar mais do que livros; esperança.
Nesses lugares, as escolas foram varridas pelas explosões da guerra e as poucas que restaram ficam a horas de viagens das comunidades. O resultado é uma taxa de alfabetização muito baixa em toda a província, variando de 0,5% a 31% para adultos, dependendo da região e sexo. Vale lembrar que o país já passa por conflitos a mais de década, em duas fases diferentes das guerras internas e externas.
A ‘Bicicleta Biblioteca’ surgiu em meados do ano de 2015, com 200 livros infantis arrecadados com o dinheiro de amigos do professor que abraçaram o projeto. Hoje, conhecida mundialmente, a ‘Bicicleta Biblioteca’ tem uma acervo de mais de 3.500 livros e ganhou mais vinte voluntários para levar o conhecimento sobre duas rodas. Saber Hosseini também conseguiu montar a primeira biblioteca pública da cidade de Bamiyan, capital de Bamyan onde leciona.
Ainda em entrevista ao MSN, Hosseini explicou como socializa o grande acervo de livros: “Deixamos alguns exemplares com as crianças de um vilarejo e na semana seguinte trocamos por outros livros.”. Dessa forma os livros estão sempre rodando entre as comunidades carentes, possibilitando que cada criança tenha acesso a muitos títulos diferentes. O professor ainda disse que alguns adultos desses vilarejos também tem pego os livros mais avançados para treinar a leitura.
Os voluntários da ‘Bicicleta Biblioteca’ também estão viajando ao Irã para comprar exemplares mais avançados e diversos, pois a publicação de livros no Afeganistão é limitada. Após quase um ano de projeto, Hosseini vê que os pequenos já podem desenvolver mais a leitura. Autores como Victor Hugo, Jack London, Antoine de Saint-Exupéry, Samad Behrangi (escritor iraniano) e Ferdowsi (poeta iraniano) estão sendo incluídos nas leituras das crianças.
Durante as visitas de Saber Hosseini e seus voluntários, temas como guerra e drogas também são abordados. Até mesmo o slogan “Diga não as armas, diga sim aos livros” foi adotado. Hosseini escreveu ao MSN que em sua última visita a um vilarejo as crianças receberam ele com armas de brinquedo na mão, propondo que ele ficasse com todas elas em troca de serem o primeiro lugar a ser visitado no tour seguinte. “Elas queriam ser as primeiras a poder ler os novos livros. Foi o momento mais gratificante da minha vida.”, comenta o bike anjo.
Quando questionados sobre o por quê de usarem bikes para visitar as crianças, os integrantes do Bicicleta Biblioteca explicaram que os lugares onde vão nem mesmo um carro 4×4 chegaria. “Além do que, a bicicleta é um grande símbolo contra o terrorismo. Alguns ataques talibãs são feitos de bicicleta e nós queremos mostrar que ela também pode, e deve, levar a cultura.”, acrescentou Saber Hosseini.
Mas apesar do belíssimo trabalho, Hosseini conta que já recebeu diversas ameaças de morte por telefone, nas quais, do outro lado da linha, um homem o ameaça caso livros não-islâmicos sejam distribuídos. Ele não desiste. Saber Hosseini e seu fiel time acreditam na transformação que estão promovendo. “Essas crianças vivem uma vida estressante, em meio a violência e muitas mortes. Nós vamos continuar levando prazer e calma para eles através dos livros.”, escreveu Hosseini.