Carnaval de rua: não é não e vidro não é lixo!
É mês de fevereiro! O Sol esquenta do Mar ao asfalto, e São Paulo se prova mais uma vez ser destino certo dos foliões, paulistanos ou não. Mas enquanto milhares compram sacos e sacos de purpurina, tem muito ciclista tendo que gastar uma grana com remendo e câmara extra.
Pedalar pela capital nessa época do ano já tem se mostrado um exercício de paciência e alguma habilidade na hora de desviar de um pedaço ou outro de vidro mais visível. Mas são os pequeninos que escancaram os números exorbitante do que tem se chamado de lixo. Apenas o balanço oficial desse final de semana (3 e 4), divulgado pela prefeitura de SP, fala em 450 toneladas de “lixo” recolhidas; fora dos sacos ficaram os que furam nossos pneus e dentro, toneladas de um material nobre demais para ser descartado em aterros.
Uma matéria especial da videorrepórter Renata Falzoni durante a Copa do Mundo de 2014, mostra o destino incerto das centenas de sacos de lixo recolhidos em uma madrugada no bairro da Vila Madalena, região Oeste de São Paulo. Enquanto os espectadores do jogo voltavam para casa de mãos vazias, os funcionários da empresa de limpeza tinham que tomar cuidado para não se cortar ao ensacar as milhares de garrafas de vidro espalhadas pelo chão. Na ocasião, o chefe da equipe de limpeza garantiu que o material recolhido seria levado para a triagem e posteriormente reciclado, mas o que a matéria prova é que esse “lixo” foi direto para o aterro de Guarulhos.
Pois é. Se por um lado amadurecemos nossa cidadania com campanhas de respeito às mulheres e contra o assédio com a máxima “não é não”, por outro estamos longe de respeitar o espaço público e nós mesmos que, muito provavelmente, passaremos por esses lugares na manhã seguinte. E nessa hora a matemática é clara: não tem lixeira que aguente a passagem de quatro milhões de foliões arremessando latas e garrafas. Só nesse final de semana 3 e 4 de fevereiro, o pré-carnaval da capital registrou 3,95 milhões de pessoas em 187 blocos espalhados pela cidade.
É claro que a logística da prefeitura tem que ir muito além do prefeito vestido de gari para varrer as ruas da cidade, mas nem mesmo os 2.394 metros cúbicos de água e mais de 26 mil litros de desinfetante usados pela prefeitura no ano passado para limpar a bagunça, dão conta de impedir que meu pneu fure, que alguém corte o pé ou que o planeta tenha que gastar no mínimo 4 mil anos para lidar com todo esse vidro.
No carnaval de 2015, ainda durante a gestão Haddad, uma portaria tentou impedir que os ambulantes vendessem bebidas em garrafas de vidro. Mas onde falta fiscalização, tem que sobrar educação. E na ausência dos dois, o cenário se repete todos os anos.
Quem não se lembra da notícia que surpreendeu o mundo quando, também na Copa do Mundo de 2014, os torcedores japoneses foram flagrados recolhendo seu lixo, e o de outros, ao final dos jogos em estádios brasileiros. “No Japão, desde a tenra idade, as crianças aprendem que lixo tem que ser jogado no cesto ou levado para casa. Os bolsos ficam cheios de embalagens de balas, lenços de papel etc. É rotina alunos, trabalhadores, operários, donas de casa, comerciantes fazerem a limpeza da calçada, estacionamento e arredores, todas as manhãs”, contou a brasileira Nill Tomie – que desde os anos 90 mora no país – ao blog Em Discussão do Senado Federal.
Se engana quem pensa que o discurso da consciência cidadã com o lixo para nas vizinhanças dos ditos países de primeiro mundo. Desde os anos 50, as latas de lixo brasileiras levam mensagens pedindo o apoio e participação da população na dura tarefa de arrumar a bagunça que fazemos aqui nesse planeta. “É equivocado o pensamento de que limpeza urbana é um problema unicamente do poder público. Em muitos países, a população já compreendeu que o descarte e o tratamento do lixo também são responsabilidade de quem o produz. Garantir que ele chegue ao destino adequado é uma questão de cidadania e respeito ao futuro”, defende o engenheiro Carlos Aguilar – especialista em resíduos sólidos – na mesma matéria para o blog do Senado.
Contudo, parece que nesses quase 70 anos a gente só aprendeu mesmo a pular carnaval. Temos organização para produzir a fantasia e até mesmo programar a folia do pré ao pós-carnaval. Só não aprendemos mesmo a ser cidadãos.
Abaixo, confira a edição do Falzoni na Lata sobre o carnaval de rua 2017: