Espaços públicos existem para serem ocupados. E de bike!
A cultura do medo vs. a cultura da ocupação dos espaços públicos. Como eventos independentes podem fazer de São Paulo uma cidade mais humana.
Nasci em São Paulo e aqui sempre vivi. Sou de uma família de classe média, que assim como tantas outras, acha que programa de final de semana é ir ao shopping e, se o tempo estiver bom, até arriscar um parque mais vazio. Ainda bem que a gente cresce…
Sem desmerecer a atenção e os finais de semana em família, fico feliz em ser uma cidadã que questiona essa cultura do “lazer seguro”, dos eventos pagos e da “felicidade gradeada”. Se ao longo da minha infância e adolescência eu via praças vazias de dentro do carro, hoje eu chego de bike e ocupo esses “não-espaços”.
Assim foi a primeira edição do Alley Rat, uma corrida ciclística diferente pelas ruas da capital paulista. No estilo da mundialmente conhecida Alley Cat, a prova é parecida com uma grande gincana em que os ciclistas precisam chegar a diferentes locais com limites de tempo. Alguns voluntários criaram um manifesto e se distribuíram pela capital para marcar os pontos onde os ciclistas participantes deveriam passar para cumprir alguma exigência e assim pontuar com o objetivo de ganhar o desafio.
Enfim, detalhes a parte, o que quero dizer é que esse é um bom exemplo de como se ocupar a cidade de forma horizontal e autônoma, sem a necessidade de burocracias e hierarquização de poderes. Assim como os participantes, os organizadores do evento eram apaixonados pela bicicleta e dedicaram algumas horas de suas rotinas para promover um domingo de confraternização e ocupação dos espaços públicos.
O ponto de partida e chegada foi a Praça dos Arcos, local que vem sendo cada vez mais apropriado pelos cidadãos que passam pela região da avenida Paulista e querem algum lugar mais calmo para sentar, ler um livro, ou seja lá o que te faça bem e quebre sua rotina em uma cidade tão caótica quanto São Paulo. Vale dizer que essa é a mesma praça onde funciona um bicicletário público com funcionamento 24 horas e uso gratuito. Nem sei quantas vezes esse lugar já me salvou: uma sessão de cinema? Um barzinho nas proximidades? É só chegar com a bike e ter a certeza de que na volta ela estará lá.
O ponto que quero defender aqui é que ocupar espaços públicos é o que dá vida à cidade. É tentador sucumbir à cultura do medo, dar ouvidos às preocupações dos familiares (“mas esse lugar é cheio de indigentes”) , e assim entrar em um carro e só sair dele dentro de um estacionamento.
Isso não nos permite sentir a cidade, cadenciar nossa pulsação com a desse organismo vivo.
De fato não tem preço passar um domingo na praça com os amigos bebendo cerveja e andando de bike. Meus pais que me perdoem, mas indigentes só podem ser os que não gostam de gente.
Na galeria, você confere as fotos desse domingo pelas lentes de Michel Will!