Entenda a relação entre gênero e acesso à cidade
Por precisarem realizar deslocamentos além de casa-trabalho, o tempo médio das viagens femininas é menor, e por consequência, a possibilidade de distância alcançada também.
A Prefeitura de São Paulo, através da UMAPAZ, promoveu nessa semana um debate sobre a mobilidade na perspectiva de gênero. Engenheira civil e fundadora do Grupo de Estudos de Gênero da Poli-USP, Haydee Svab conduziu a palestra apresentando dados importantes sobre os deslocamentos na cidade de São Paulo e propôs a análise comparativa de prisma espaço-tempo de homens e mulheres.

Mulheres dominam ciclovia da Faria Lima © Fel Meireles
O que é prisma espaço-tempo? Em resumo: são os elementos que determinam quão distante uma pessoa pode ir, em um dia de trabalho, da sua residência, considerando o tempo de deslocamento médio de cada modal e o papel social que cada um desempenha.
Sabendo que o tempo médio de cada modal na cidade de São Paulo são os seguintes: carro (20 Km/h), ônibus (14 Km/h), bicicleta (15 Km/h) e a pé (5 Km/h), é possível fazer uma análise da possibilidades de deslocamento de cada cidadão. Usando os exemplos apresentados por Haydee, que partem de uma situação ideal de oferta de estrutura de transporte, constatamos que quanto mais tempo gasto para percorrer quilômetros na cidade, menos possibilidade de emprego e vida social uma pessoa terá.
Um homem com um carro próprio tem mais possibilidades de escolha de emprego do que uma mãe solo que com seu filho se desloca de ônibus pela cidade, ou mesmo que o fizesse também com um carro particular. Isso porque o histórico de deslocamento feminino é bastante diferente, a começar pela quantidade de viagens feitas em um mesmo dia para concretizar todas suas tarefas.
As cidades nos tempos atuais ainda são pensadas em uma perspectiva masculina, gerando empecilhos para as mulheres irem mais longe, em todos os sentidos. “Não se trata de apologia a longos deslocamentos, mas das possibilidades de cada gênero.”, pondera Haydee sobre os gráficos apresentados. Confira abaixo:

Gráficos sobre o Prisma Espaço-Tempo/ © Giuliana Pompeu
Por precisarem realizar deslocamentos além de casa-trabalho, o tempo médio das viagens femininas é menor, e por consequência, a possibilidade de distância alcançada também. A rotina de deslocamento atrelada aos afazeres doméstico poda as possibilidade de empregos almejados e lazeres pessoais das mulheres. Ainda assim, Haydee afirma que os últimos 40 anos mostram uma apropriação do espaço público pelas mulheres, e que o caminho é pensar as estruturas da cidade na perspectiva feminina. Dessa forma, crianças também tem mais acesso aos espaços públicos.
Mulheres e os modais ativos
Mulheres são a maioria dos pedestres da cidade de São Paulo. Muitas vezes acompanhadas de crianças, fazem pequenos trajetos no entorno de suas residências, e veem refletidas nas vias para pedestres a realidade de um Brasil que mistura atribuições públicas e privadas, sem muitas vezes privilegiar o usuário. “Calçada é um símbolo do Brasil. Seu uso é público, mas a administração é particular.”, explica Haydee.
Em São Paulo, onde 3% dos deslocamentos da cidade são feitos em bicicleta, apenas 6% são realizados por mulheres. “Existe alguma coisa no espaço da cidade que diz para as mulheres que andar de bicicleta não é para elas. As ciclovia não são a garantia de mais mulheres pedalando, mas a infraestrutura é uma linguagem de pertencimento; traz uma mensagem de venha para a rua.”, comenta Haydee.

Palestra sobre mobilidade e gênero na UMAPAZ/ © Giuliana Pompeu
Finalizando a manhã de discussões, Haydee montou uma roda com as mulheres presentes para comentar os desenhos dos percursos feitos por nós no começo das atividades. As que se deslocam de modal ativo, ou mesmo de ônibus pela cidade, foram as que mais representaram afetividade em seus percursos. O carro e o metrô são modais que nos distanciam da interação com o espaço público.