Uma mobilidade para mulheres é antes de tudo para todos
Evento Mobilidade Urbana na perspectiva das Mulheres trouxe a SP a discussão de uma cidade mais inclusiva para todos. Veja na matéria os assuntos de destaque desse debate
Nessa segunda-feira (05), um evento inédito reuniu dezenas de mulheres em São Paulo para debater a mobilidade urbana na perspectiva de gênero. Com quatro painéis, abordando diferentes perspectivas da ocupação da cidade por mulheres, o evento deu plena representatividade feminina nas falas das palestrantes.

Arte do cartunista Reynaldo Berto
O Bike é Legal esteve presente ao longo de todo dia, e reúne nessa matéria pontos de destaque expostos nesse importante espaço de fomento a inclusão de mulheres nas políticas públicas das cidades.
Inclusão
Ao longo da fala de todas as 20 painelistas, uma palavra pode ser destacada como principal eixo do debate: inclusão. Para que a cidade possa ser mais acessível, é preciso que todas as necessidades sejam incluídas e o ponto de partida é reconhecer tais necessidades.
As mulheres são responsáveis por mais de 50% dos deslocamentos na cidade de São Paulo e essa maioria não é refletida na maneira como a cidade pensa sua mobilidade. Historicamente, mulheres realizam mais e menores deslocamentos ao longo do dia. Mas, a mobilidade na cidade é pensada apenas do ponto A ao ponto B, casa-trabalho, um tipo de mobilidade predominante masculino.
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Mas os desafios de uma mobilidade inclusiva não estão só nos meios de transporte, e sim no acesso a toda a cidade e a inclusão de diferentes realidades sociais. Alimentação, lazer, escolaridade, tudo isso está dentro da mobilidade.

Mila Guedes/ © Giuliana Pompeu
O terceiro painel trouxe para o debate a perspectiva de uma mulher com necessidades especiais na fala da publicitária Mila Guedes. Ela lembrou suas experiências na cidade de Chicago, nos EUA, onde ela “não era lembrada o tempo toda da sua limitação física” e por conta de uma urbanização inclusiva podia viver a cidade plenamente. “Acessos deficientes geram pessoas deficientes!”, comentou Mila.
Outro recorte foi feito na fala da representante da Organização Cidade dos Sonhos, Gabriela Vuolo. Na ocasião, foi abordada a questão da intensificação da exclusão das mulheres durante períodos de maior dedicação aos filhos. “O transporte público como se apresenta não é capaz de assegurar a integridade de uma mulher grávida, tão pouco de uma mulher, ou mesmo de um homem, com filho pequeno.”, comentou Gabriela.
Assédio no transporte público
Questão latente na vida das mulheres, o assédio no transporte público é uma grande barreira para a segurança das mulheres em seus deslocamentos. Nesse sentido, a jornalista Ana Carolina Nunes falou sobre seu trabalho com o Metrô de São Paulo, onde dialogou sobre novas políticas para combater abusos sexuais.

Ana Carolina Nunes/ © Giuliana Pompeu
Em sua fala, Ana desmistificou questões que são superficialmente apontadas como facilitadoras desses atos, e apontou fatores importantes que de fato impedem um combate efetivo a esses crimes. “Não é a lotação que gera facilidade para os abusadores, os piores casos acontecem quando não há vigilância.”, comenta Ana Carolina.
Até esse recente diálogo, o Metrô insistia que o baixo índice de denúncias mostravam que essa não era uma questão latente. Nesse sentido, Ana Carolina Nunes explicou que “quem cala não consente”, e que o baixo número de denúncias faz parte de um mecanismo que desencoraja a vítima e não pune o abusador. “As denúncias tem que ter um caminho fácil e efetivo. Os funcionários tem que colaborar e não dificultar.”, completa Ana.
Ainda nesse sentido, Ana falou sobre o polêmico projeto do Vagão Rosa, que pretende segregar as mulheres em um único vagão do metrô para evitar abusos. “Segregar as vítimas não resolve, só restringe ainda mais sua mobilidade e trata os homens como descontrolados.”, conclui Ana Carolina.
Conclusão
Grande parte do debate do evento foi baseado em dados de recentes e importantes pesquisas sobre mobilidade, que refletem a vivência das mulheres na cidade. E para as palestrantes, esse é um importante eixo de construção de uma mobilidade, e de uma cidade, mais inclusive. “ É a partir da coleta e da manipulação de dados que políticas públicas surgem. Nós mulheres precisamos estar nesse trabalho para que a cidade pense mulher.”, comenta Rosemeiry Leite da CET.
A articulação das mulheres nesse sentido é muito importante, e é preciso ficar de olho para não perder os espaços já conquistados. O Conselho Municipal de Políticas para Mulheres por exemplo, já sofre risco de extinção com a nova gestão de Doria.
Se é possível uma conclusão, já que esse evento é declaradamente o ponta pé de outros espaços para iguais debates, nós como sociedade, ainda em um movimento de intensificada urbanização, precisamos seguir esse processo pensando na população, em cidades com qualidade de vida para as pessoas que nela habitam.