Na trilha com o mestre Márcio Ravelli
Neste último domingo, convidados pelo Márcio Ravelli, fomos até Itu para conhecer um pouco das inúmeras trilhas que a cidade tem. Quando soube que ele pessoalmente nos levaria, deu até um frio na barriga, afinal, ele foi doze vezes campeão de mountain bike na modalidade XCO, medalha de bronze no mundial, atleta olímpico, convidado para levar a tocha, enfim, um mito do esporte. Logo fomos avisando que teria que ser modalidade “passeio” ou teríamos que acompanhá-lo de moto.

Márcio Ravelli/ © Ricardo Gaspar
Durante o giro, além de nos apresentar os atrativos da trilha (a cruz, a subida do lobisomem, o castelo e o zig zag), fomos conversando, lógico que quando eu tinha fôlego, pois ele falava naturalmente e nem água levou para fazer os 40km com 1.000 de altimetria.
Hoje em dia, Márcio Ravelli alterna seus treinos com a organização do GP Ravelli, no qual também participo há dois anos. É desafiador tanto para amadores, quanto para a turma do “Sai que é Pro”; frase que a elite grita quando encontra o pessoal da Sport. São quatro etapas por ano e mais uma festiva para finalizar, cada uma delas reúne cerca de 1.200 a 1.600 atletas, que sabem que, independente da categoria escolhida, irão sofrer e irão aguardar ansiosamente a próxima. Ele proporciona o mais puro mountain bike: subidas duras, descidas insanas, singles técnicos, obstáculos inusitados como escadarias e até uma mini boate foi montada em uma das etapas, onde luzes e um rock n roll injetavam adrenalina para continuar.
Durante o bate papo, o que me chamou a atenção foi a dificuldade relatada para conseguir patrocínio e apoio nas provas. Estamos falando de um dos maiores nomes do ciclismo, o incentivo deveria ser natural das grandes empresas, mas não é isso que acontece.
Existem dois tipo de recursos que um atleta pode tentar captar: público, onde você apresenta o projeto, entra na fila de espera. E como todos sabem, leva tempo e existe um pedágio ali e outro aqui; Ou o privado, que você arregaça as mangas e vai bater de porta em porta, afim de obter verba para fazer a prova.
A logística de cada etapa é cheia de detalhes: confecção do kit, cronometragem, placas, montagem da arena, sinalização, equipe de apoio, hidratação, medalhas, prêmios, serviço médico e etc. Esse valor gira em torno de R$ 80.000,00 por etapa, e tudo precisa funcionar perfeitamente, lembrando que você está lidando com situações que podem mudar do dia para noite. Ravelli nos contou que em algumas etapas, devido à chuva, foi preciso mudar o trajeto de madrugada, para não colocar atletas em risco.
O trabalho de planejamento leva meses, desde a escolha da cidade, até a definição do trajeto, que geralmente são exclusivos. Em uma das partes, passamos por um single, que ele pessoalmente havia aberto; um GPS, facão, enxada, coragem e muito amor pelo ciclismo. E mesmo sendo renomado, fazendo um trabalho impecável, sendo referência na modalidade, a dificuldade de conseguir patrocinadores pede um trabalho de Hércules. É natural que as empresas esperem retorno e visibilidade, mas precisam, acima de tudo, acreditar no segmento e dessa forma o mercado ficar cada vez mais atrativo e melhor.
O Brasil vem melhorando na modalidade, mesmo que ainda muito longe dos países europeus. O que precisamos entender é que a bicicleta não é só lazer, ela pode representar uma parte significativa na economia, movimentar o mercado, gerar emprego e muito lucro. É um baita negócio que tem muito campo para crescer e é fundamental apoiar quem promove de forma séria esse segmento.
Falando agora como fã, fiquei atrás dele, observando a pilotagem, e é impressionante a fluidez e a naturalidade dele em cima da bicicleta. Passamos por lugares com mata fechada, lama, pedras e ele sumia e nos esperava lá na frente, impecável, como se estivesse indo para um casamento, e eu, com o capacete virado, óculos torto, mato preso na orelha e ofegante, perguntando se faltava muito; homem e máquina fazendo uma simbiose perfeita.
Ele coordena clínicas de mountain bike, do iniciante ao avançado, e como todos que tem uma liderança altruísta, foi nos passando técnicas de pilotagem, em uma delas falou que aprender o BOB facilitaria muito a condução da bicicleta, passei o resto do dia tentando entender a manobra que nem sabia que existia.
Torço para aparecerem mais Ravelli para o bem do ciclismo, que como atleta ainda tem fôlego pra andar com a turma de elite -e que não duvido que em breve aumente a coleção de títulos da carreira-, que como empreendedor sabe como ninguém organizar excelentes provas e que como pessoa é de uma humildade do tamanho do seu talento.
Obrigado, mestre!