O peso, a bike e a vida
Foram nesses longos trechos em que você é obrigado a fazer escolhas, pra levar estritamente o necessário, e onde cada 100 gramas representam mais ou menos dor no caminho
Dentro de tantas lições aprendidas nas dezenas de quilômetros rodados, é possível traçar paralelos entre girar a bike e o passar dos anos.
A bicicleta é um objeto interessante, em muitos casos, entra na vida das pessoas em algum momento turbulento, por motivos de saúde ou pessoal. No meu caso, estava sofrendo de ansiedade e depressão e pedalando era onde eu me sentia bem, o vento no rosto, e as janelas da memória da infância escancaradas.
Tinha uma bicicleta antiga e ganhei da minha esposa uma novinha, mal sabia ela o que estava fazendo. Fui até a farmácia comprar um frasco de colírio e na volta encontrei o cadeado partido no chão, voltei com a conjuntivite, sem bike e tendo que explicar em casa.
Achei que era um dia terrível, entrei em contato com a loja, que me indicou um grupo que poderia me ajudar, o Lokobikers. Vi que existiam passeios noturnos todos os dias. Voltei a minha aro 26 de 1999 e comecei a conhecer literalmente São Paulo.
Para quem nunca fez isso, passear pela cidade é completamente diferente de passar de carro ou ônibus, os sentidos ficam mais aguçados, o aroma, a atenção faz você se ligar nos detalhes e de quebra se conectar com pessoas diferentes, fora que nesses passeios sempre tinha a parada gastronômica, ou seja, emagrecer não era possível, mas provei o pernil do Estadão, a esfiha Imigrantes, Hot Dog, e coxinha de inúmeras padarias.
O segundo passo são as trilhas e passeios de final de semana, conheci cachoeiras e lindos mirantes, depois as provas de longa distância e finalmente as cicloviagens, o Caminho da Fé, onde passei sete dias, sendo o meio e a viagem.
Foram nesses longos trechos em que você é obrigado a fazer escolhas, pra levar estritamente o necessário, e onde cada 100 gramas representam mais ou menos dor no caminho, provocam o início da metamorfose.
Sim, precisamos de conforto, existem itens essenciais……será que precisamos tanto de conforto e esses itens são mesmos essenciais ? Disto não abro mão…..isto vai me fazer mais ou menos feliz no meu caminho ?? Isso não pode faltar, vou levar bastante……Será que durante o percurso não posso encontrar exatamente isso ou algo melhor?
Essas questões passam a dominar nosso modo de pensar, o olhar da vida muda de perspectiva, quanto peso, quantas pedras, nos obrigamos a carregar ano após ano, sem mesmo entender o sentido. vamos acumulando peso por não percebermos, pela sensação de segurança.
Qualquer caminho com peso fica mais duro, mais árduo, muito menos prazeroso, perde se a leveza, o apreciar e o curtir o trajeto.
Que tal esvaziar um pouco a mochila hoje mesmo?