Diário das Magrelas: Buenos Aires, a capital da Argentina e das pessoas
Buenos Aires é uma das cidades da América Latina com maior circulação de pedestres e nos últimos anos vem provando que com mudanças simples é possível tornar o espaço público mais humano
Magrela em todas suas peças, ela foi me levando pelas ruas da capital portenha. Fui vendo os antigos prédios que seguem ocupados por latinos de todos o cantos e as ruas recém reformadas que dão mais espaço para as pessoas. Experimentei pedalar pelas grandes avenidas que desafogam o tráfego e ajudam a fazer das ruas dos bairros um lugar de velocidade baixa. Nessas ruas onde o limite máximo pode ser de até dez quilômetros, o passo das pessoas tem mais pressa; eles mantêm forte o comércio de rua e são capazes de alcançar travessias até mesmo nos faróis vermelhos.
Pedalando pela cidade de Buenos Aires senti mais forte a sensação de proteção à vida. Compartilhei as ruas com motoristas que por muitas vezes preferem ficar atrás da bicicleta por algumas quadras, a ultrapassar um ciclistas sem uma distância segura. Tive uma única experiência, durante a noite, na qual o condutor mexia no celular e não prestava atenção a minha presença. Via de regra, quem dirige em BA precisa estar atento a presença massiva de outros modais. Até mesmo nas avenidas, onde os ônibus seguem pela direita, o ciclista deve ir pela esquerda. Quem diminui a velocidade é o transporte individual.
“A bicicleta é com certeza a melhor maneira de se deslocar pela cidade. É o transporte mais rápido e mais barato.” , comentam dois amigos brasileiros que hoje vivem na capital argentina. Fiquei na cidade durante duas semanas, na primeira caminhei e na segunda pedalei. Os bairros centrais são bastante pertos e chegar da famosa Rua Florida até o Bairro de São Telmo leva 15 minutos a pé e menos de cinco pedalando. De bike se chega a qualquer canto da cidade, com o privilégio de não passar por praticamente nenhuma subida. Até mesmo na noite que saboreie um bife de chorizo de 800g e algumas centenas de peso, cheguei de bicicleta.
Durante a janta, as bikes ficaram presas em uma árvore do outro lado da rua do delicioso Las Cabreras, estacionadas como é costume, e possível, por ali. Na maioria dos prédios com uso público, sobretudo culturais, um bicicletário está sempre cheio. Mas parar a magrela na rua, seja nos esparsos paraciclos espalhados pela cidade ou em um poste, é sempre uma opção segura. Além da segurança em relação aos motoristas, durante os pedais senti muito menos medo do que costumo sentir em São Paulo. De alguma forma, a segurança está refletida na extensa presença de mulheres se deslocando de bicicleta pela cidade, em qualquer horário do dia. Assim como em qualquer cidade, a bicicleta significa um ganho de autonomia nas nossas vidas e é inspirador ver tantas mulheres de diferentes idades cruzando a cidade em cima da magrela.
Assim como a bicicleta que tive a oportunidade de pedalar durante minha viagem, as bikes verdadeiramente magrelas fazem sucesso entre os ciclistas. Elas facilitaram muito na hora de subir as escadas de alguns prédios mais baixos. O fato da cidade ser bastante plana também facilita pedalar uma bike sem marchas. Mas confesso que senti uma saudade de estar com a minha híbrida de 24 marchas, ainda mais quando cruzava com algumas bikes menos urbanas.
Se não tiver nenhuma bike a sua espera, o sistema de bicicletas compartilhadas mantido pela prefeitura conecta a cidade de maneira gratuita e com serviço 24h. Através do site do Ecobici você pode se cadastrar e habilitar o aluguel. Aqui você pode conferir o mapa dos mais 160 km de ciclovias da cidade.
Para além das bicicletas, o transporte público também tem prioridade em Buenos Aires. Um amplo sistema de ônibus liga toda cidade, 24 horas por dia. No final de 2014, a Avenida 9 de Julio – a mais importante da capital e uma das mais largas do mundo (14 faixas) – passou a ter suas quatro faixas centrais destinadas a circulação do Metrobús e reduziu em praticamente 50% o tempo de deslocamento dos usuários de transporte público na avenida. Com o horário de fechamento ainda mais cedo do que na cidade de São Paulo (por volta das 22h30), o metrô de Buenos Aires é simples, mas extremamente eficiente. Suas seis linhas chegam a todos os bairros da cidade e os mais distantes são alcançados pelo sistema de trem da capital.
Para se ter uma noção, com a mudança de governo o preço do transporte público duplicou, mas continua sendo muito menor do que nas cidades do Brasil. A média nos dias atuais é de seis pesos, algo em torno de R$ 1,50, dependendo da distância que será percorrida. A minha crítica é na restrição do pagamento somente através do bilhete único; apenas com dinheiro não é permitido embarcar.
Buenos Aires é uma das cidades da América Latina com maior circulação de pedestres e nos últimos anos vem provando que com mudanças simples é possível tornar o espaço público mais humano e muito mais seguro. Termino esse texto com uma saudade apertando o peito, por tudo que vivi nessa cidade maravilhosa, com pessoas incríveis. Até breve, BA!
Dicas para curtir BA
Comida
Eu simplesmente virei uma cliente fiel do ‘El Banco Rojo’; o restaurante é maravilhoso, tem várias opções e os preços são mais em conta do que um lanche em qualquer rede de fast-food. O endereço é Rua Bolívar, 914. Vale a pena!
Mas se seu desejo for comer um tradicional, e gigantesco, bife de chorizo, minha dica é o restaurante La Cabrera. O bife de chorizo de 800g, com 12 pequenas porções de acompanhamento, sai 480 pesos, algo em torno dos R$ 120,00. Não é barato, mas você não come bem assim aqui por São Paulo jamais. Vale dizer também que o restaurante é daqueles para se perder horas, tanto na fila, quanto na mesa!
Parques
A cidade possui diversas praças e parques, espaços que ficam lotados de gente; a cultura do uso do espaço público é bem grande na cidade. Mas com certeza, minha melhor experiência foi na Reserva Ecológica. O espaço é como um parque linear que segue ao lado da Costanera Sur e foi o único lugar que consegui ficar as margens do Rio da Prata.
Compras
Não poderia terminar esse texto sem dizer: vá a Feira de São Telmo! É a coisa mais incrível que já vi na vida, quando a questão é artesanatos. São praticamente 15 quadras cheias de barraquinhas com as mais diversas artes. A galera é muito talentosa.
No mermo bairro, durante a semana, funciona o Mercado de São Telmo. É como um Mercado Municipal, mas o foco é mais nas roupas e antiguidades. Um lugar perfeito para garimpar um casaco de couro e canetas de tinteiro.