Manifestante picha ciclovia e polícia o obriga a limpar. Isso é legal?
Essa sequência de fotos tomaram as redes sociais durante o último final de semana. A primeira publicação no Facebook a conter as três fotos teve mais de dois mil compartilhamentos e foi retirada do ar
No último domingo (20), a ação de um manifestante pró-impeachment foi registrada em fotos, vídeo e deu o que falar nas redes sociais. Primeiro, o homem pega seu pincel e rabisca a ciclovia da avenida Paulista – que, vale lembrar, já estava pichada por cidadãos contra o impedimento da presidente Dilma Rousseff (PT).
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Alguns minutos depois, a Polícia Militar intervêm na ação…
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E no final, o homem acaba com balde e escovão na mão limpando a bagunça.
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Essa sequência de fotos tomou as redes sociais durante o último final de semana. A primeira publicação no Facebook a conter as três fotos teve mais de dois mil compartilhamentos e foi retirada do ar nessa segunda-feira (21).
O manifestante retratado nas fotos começava a pintar uma espécie de respostas à pichação anterior. Logo abaixo do “Dilma fica” pintado de branco, o homem estava marcando “..em casa, melhor que no Plana..” de tinta preta quando foi abordado.
Apesar da ‘limpeza simbólica’ imposta ao rapaz, as marcações no piso ainda eram bastante visíveis nesta segunda-feira (21).
Conversando com o autor dos cliques originais, que prefere se manter em anonimato devido à grande repercussão, me foi explicado que houve retaliações em sua página pessoal no facebook e que, por isso, ele preferiu deixar as fotos em privado, tornando os arquivos compartilhados indisponíveis. De qualquer forma, ele autorizou a publicação das mesmas no Bike é Legal.
“Foram poucos os que ficaram asisstindo toda a ação da Policia Militar, a grande maioria só viu o rapaz limpando a ciclovia e muitos acharam que ele estava fazendo isso por vontade própria. A PM ficou de longe vendo ele limpar e não interviu no momento em que um homeme pró-governo passou e gritou alguma coisa. O manifestante retrucou e continuou a limpar a ciclovia.”, relatou o autor das fotos.
A ação da Polícia Militar de São Paulo foi comemorada por muitos ciclistas, que eufóricos compartilharam a história com aquela velha e ordinária sensação de alma lavada. Emoções à parte, podemos levantar a questão da legalidade dessa ação da PM, que por mais divertida que possa parecer, desrespeita um direito garantido do infrator que vandalizou a ciclovia.
Conversando com o Mestre em Direito Penal pela Universidade de São Paulo (USP), Daniel Pereira, alguns pontos foram esclarecidos: “É inadmissível que a Polícia Militar, por mais bem intencionada que tenha sido, queira extrapolar as suas atribuições legais, previstas no Art. 144 da nossa Constituição, que trata da Segurança Pública. A PM pode, além de realizar a polícia ostensiva, apurar as infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens. Jamais julgar e aplicar penas ou transações penais.”
Daniel vai além e explica a quem caberia uma punição contra o homem que rabiscou a ciclovia: “A transação penal, prevista na Lei Federal 9.099/95 (e outras leis conexas), prevê que é de competência dos juizados especiais criminais (“JECRIM”), provido por juízes (togados ou togados e leigos), a competência para a conciliação, o julgamento e a execução das infrações penais de menor potencial ofensivo, como essa “singela” pixação.”
“A transação penal imposta pelo policial é ilegal. Não foi crime de menor potencial ofensivo, dentro da legislação em vigor. Foi, sim, muito ofensivo, principalmente para aqueles que utilizam a ciclovia diariamente, mas policial não é justiceiro. É auxiliar da justiça, no máximo. E ao fazê-lo limpar a ‘merda’ que fez, errou de novo. Afinal, o cidadão em questão, tolo ou não, foi humilhado sem o devido julgamento. Acho ele culpado, sim, mas talvez ele até preferisse varrer a Paulista por seis meses ou um ano do que essa execração pública. E eu, como cidadão e ciclista (além de advogado, tão desrespeitado ultimamente), preferia isso ante as fotos que o massacraram. Eu quero a lei, não “justiçaria”. Está tudo errado. De novo. Nada a aplaudir. Não se pode aceitar “dois pesos, duas medidas”. Para nenhum lado. Nunca”, conclui Daniel Pereira.
Em tempos de tantos julgamentos sem embasamento na nossa legislação, é importante lembrar que o nosso Estado Democrático de Direito prevê regras para a conduta de todos, sejam eles membros do Legislativo, Judiciário ou Executivo. Vivemos em uma democracia e não em um circo.
Abaixo, você pode conferir como foi a abordagem dos policiais em um vídeo publicado pelo canal do Diário do Centro do Mundo: