Ser mulher e o constante equilíbrio das energias e pedaladas
Negar nossa força é tão problemático quanto negar nossa feminilidade. Precisamos entender que uma sociedade saudável, livre da desigualdade de gênero só se faz sem estereótipos
Foi em 1917 que o dia 8 de março ficou marcado pela luta feminista. A data foi estipulada na Rússia, nas vésperas da revolução com a deflagração da greve das tecelãs de São Petersburgo. Como quase todas as datas memoriais, nosso sistema impregnou no Dia Internacional da Mulher um espírito de comércio e celebração quase vã. Mas a verdade é esse dia tão forte é um dia de luta, uma data para reavaliarmos todas as condições de opressão que experienciamos ao longo do ano.
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Clara e eu na Ciclovia da Sumaré
Nascer mulher carrega em si desafios profundos, é a certeza de largar na corrida com muitos metros de desvantagem social. Mas muito mais do que desvantagens, nascer mulher é a certeza de ser detentora de um corpo-templo, onde os ciclos tornam nossa existência uma experiência única e cheia de luz.
Como mulher, poderia nesse texto divagar sobre muitos aspectos da nossa existência e resistência. Falar sobre os preconceitos que sofremos dentro e fora de casa, sobre as duplas e triplas jornadas que muitas de nós precisamos ter para ser mãe, trabalhadora, esposa, filha, estudante e feliz. Mas quero me debruçar com maior esforço sobre o equilíbrio da nossa energia, o mesmo que mantém nossas pedaladas em constante movimento.
Todo ser humano tem em si energia feminina e masculina, mas vivemos em um mundo onde elas em desequilíbrio é um sinal de força ou de feminilidade. Segundo crenças xamânicas, a energia feminina é uma energia dos detalhes, da calma e da reprodução. Enquanto a energia masculina é um sinal de força, determinação e ações concretas. Para mim, ambas parecem importantes e as duas precisam estar presentes na vida de todo ser humano.
Mas quando criança, subindo em árvores e sentada com as pernas abertas, o que mais ouvia de minha biza era: você precisa ser mais feminina. Queria que hoje ela estivesse viva, de boca aberta com minhas pedaladas diárias, imaginando o que os homens pensam de mim quando me veem em cima de uma bicicleta pelas ruas de São Paulo. Queria dizer a ela: Biza! Eu pedala, estudo, trabalho, me divirto e continuo sendo mulher. Posso passar um batom ou não passar, posso cruzar as pernas ou não cruzar e nada disso tirará de mim a verdadeira essência de ser mulher.
Negar nossa força é tão problemático quanto negar nossa feminilidade. Precisamos entender que uma sociedade saudável, livre da desigualdade de gênero só se faz sem estereótipos, sem regras de como ser ou não ser mulher. Idem para homens.
Mas a verdadeira mensagem que quero passar nesse Dia Internacional da Mulher é: busque suas ações de poder. Para mim, começar a pedalar como meio de transporte foi transformador e desencadeia dia após dia pensamentos e ações que me tornam mais empoderada e sobretudo, mais feliz.