Falta costura no mercado de bicicletas do Brasil
Uma total falta de sincronia de conhecimentos do próprio mercado, por quem vive do mesmo é o que fica claro ao final da Brasil Cycle Fair
A Cycle Fair deste ano serviu mais uma vez de raio X do que acontece no segmento de bicicleta no Brasil, desde negócios, o tal do “compra e vende” até as políticas públicas por trás disso tudo; uma total falta de sincronia de conhecimentos do próprio mercado, por quem vive do mesmo.
A feira experimenta um êxodo das marcas âncoras, as grandes montadoras, o que impacta o sucesso de um evento como esse que precisa, além de lojistas, da presença do público final.
Desde 2014, as marcas da Dorel (a saber: Caloi, Cannondale, GT, Mongoose) não comparecem. Com isso, exceção feita a Bia Ferragi que também é colaboradora do Bike é Legal, os atletas patrocinados por essas marcas, estrelas do segmento, também não estavam por lá.
De âncora esse ano só a Scott e a Merida, ao lado das heróicas marcas brasileiras DreamBike, Galileus e Soul. A Groove apresentou-se fora da Feira. Deu gosto ver a evolução dos quadros feitos a mão aqui no Brasil por Denis Cardoso e Tom Cox.
Divulgação/Roberto Furtado/Brasil Cycle Fair
Ciclo de debates no Espaço Conteúdo contou com a presença de cicloativistas de todo o Brasil
Por conversas, entendi que, apesar da crise, o mercado “até que vai”. Isso significa que poderíamos estar bem pior, não fosse a mobilidade em bicicleta estar impulsionando o mercado.
Aí vem a maior crítica que faço – e sempre fiz – ao segmento. Exceção feita aos estandes nanicos como o Hand Made em Brasil, nenhum deles tem produtos de mobilidade pensados a partir da própria necessidade de quem se locomove em bicicleta. São pessoas que não pedalam que “inventam moda” ou – falando bom português – “cagam regras” para os que vão em bicicletas e com isso perdem mercado.
Assim, bicicletas de rodar na cidade chegam com pneu de cravo e sem bagageiro, ou com uma cestinha torta e mal instalada a frente da bicicleta. Estas por sua vez, por serem “apenas para cidade”, são de baixíssima qualidade, pesadas, um lixo, sem nenhuma proposta em sua geometria. Quem quer comprar uma porcariamdessas? Muitos dos que caem nesse engodo deixam de pedalar.
Acessórios de todos os tipos, mas pouco práticos para os que pedalam como meio de transporte e por aí vai.
Nos estandes, “mulheres objeto” sem qualquer formação técnica intimidam, pior, afugentam os que querem saber mais sobre os produtos expostos.
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O ciclo de debates no Espaço Conteúdo, promovido pela UCB e a Ciclocidade, e patrocinado pelo Itaú foi excelente e marcado pela presença de cicloativistas de todo o Brasil; no entanto dentro de uma feira onde os presentes, além dos próprios ativistas, não estavam nem aí com o conteúdo discutido. É o tiro no pé, os comerciantes não se interessam, não se engajam, não se informam e com isso perdem mercado.
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Um evento desses, agora com ciclovia e bicicletário na porta, merecia o acesso de um público potencialmente interessado no assunto.
Além da presença de Antonio Olinto, não vi nenhum estande relacionado ao CicloTurismo, atividade que promove na União Européia um giro de 44 bilhões de Euros anuais, ou seja, mais um lado importantíssimo desse segmento que de fato impulsionaria o mercado, que é totalmente ignorado.
Em suma, o que falta nesse mercado é a ligação do ciclismo como esporte, transporte, lazer, às políticas públicas sendo impulsionadas por demandas da população e das associações de comércio em especial as de estâncias turísticas.
Ou seja, falta costura!