Londres: projeto quer ciclovia subterrânea em túneis abandonados
Trânsito caótico e pouca (ou cara) oferta de moradia. Tudo bem que os problemas de falta de espaço parecem cada vez maiores em nossas cidades, mas...
Trânsito caótico e pouca (ou cara) oferta de moradia. Tudo bem que os problemas de falta de espaço parecem cada vez maiores em nossas cidades, mas você já havia pensado em arrumar um lugarzinho para pedestres e ciclistas debaixo da terra?
Bem, foi com essa ideia que uma empresa de design acaba de ser premiada pela prefeitura de Londres, na Inglaterra.
A proposta é aproveitar túneis abandonados que antes serviam ao metrô como grandes avenidas subterrâneas para quem usa a bicicleta ou vai a pé. Além do caminho alternativo, “The London Underline” também criaria espaços para convivência, comércio e intervenções artísticas debaixo de alguns dos principais bairros londrinos.
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Já a energia para manter a área iluminada ficaria a cargo de um sistema que converte pisadas – ou o peso dos pneus passando – em eletricidade. (Desenvolvido por um engenheiro britânico, o Pavegen, inclusive, já foi testado no Brasil para fazer um campinho de futebol ficar iluminado à noite no Rio de Janeiro.)
“Agora que Londres atingiu sua maior população na história, nós precisamos pensar em maneiras de maximizar o potencial da nossa infraestrutura”, defende Ian Mulcahey, co-diretor da Gensler, responsável pelo projeto que se pretende “a solução logo embaixo dos nossos pés”.
Apesar de ter sido vencedora do prêmio de melhor projeto conceitual no “London Planning Awards 2014/15”, a ideia é vista com péssimos olhos por especialistas em mobilidade em bicicleta.
Em artigo no CityLab, o jornalista Kriston Capps recorre ao termo ‘magpie’ (corvo, em inglês), espécie de gíria de arquitetos para definir um projeto que chama muita atenção pela megalomania, mas que não deve ser levado a sério. “Esses programas não podem resolver o problema do congestionamento porque as bikes não são a causa do congestionamento. Os carros são”, reclama.
No Guardian, o articulista Fergus O’Sullivan diz que a proposta é ridícula. “Pode parecer divertido para alguns, mas é só uma maneira tão prática de desafogar as ruas quanto comprar um mini-zepelim para cada londrino.”
Um dos principais pilares de argumentação dos defensores da ideia é a segurança. Ao colocar ciclistas em um espaço exclusivo e sem disputa de espaço com veículos automotores, o número de acidentes na cidade cairia. O curioso é que a segregação é justamente a crítica mais recorrente ao projeto.
“Esse tipo de solução não busca o essencial, que é democratizar os espaços nas ruas e fazer com que todo mundo caiba nelas. É só uma forma de tirar o ciclista do caminho”, defende Thiago Benicchio, gerente de transportes ativos do ITDP-Brasil.
A ex-secretária de transportes de Nova York, Janette Sadik-Khan também endossou as críticas: “Ciclistas demais já estão a sete palmos do chão. Um plano para prendê-los debaixo da terra não vai criar ruas mais seguras”, publicou em sua conta no Twitter.
Quanto ao financiamento das obras, a Gensler não publicou uma previsão de orçamento, mas diz ser possível arrecadar fundos necessários com ações publicitárias ou até mesmo a venda dos ‘naming-rights’, como já é feito em arenas esportivas na Europa há anos.
Os anunciantes também se juntariam aos comércios e restaurantes dos túneis para arcar com vigilância e manutenção da ciclovia, que teria pontos de aluguel de bicicletas compartilhadas em cada saída.
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Terra, ar e água
Essa não é a primeira vez que arquitetos geram polêmica por um projeto chamativo voltado a quem pedala na capital inglesa. Em 2012, o conceito de uma rede de ciclovias aéreas com 221km de extensão foi apresentado pela Foster+Partners. As estruturas seriam construídas sobre linhas de trem a uma altura equivalente a quatro andares de um prédio e levariam 20 anos para conclusão.
Orçado em assustadores 12 bilhões de dólares, o SkyCycle recebeu críticas por motivos um tanto parecidos com o das ciclovias subterrâneas e foi deixado de lado pelo prefeito Boris Johnson. Relembre aqui.
O espaço ‘ocioso’ dos rios também já entrou na mira. No ano passado, um grupo chamado “River Cycleway Consortium” tentou emplacar a proposta de uma ciclovia flutuante sobre o rio Tâmisa, no coração da cidade. Custo: 965 milhões de dólares.
No Copenhagenize.com, o urbanista Mikael Colville-Andersen chega a dizer que Londres tem feito papel de idiota entre as metrópoles. ”São Frankeinsteins mutantes que mais parecem ter saído do laboratório da Marvel”, brinca.
“Há sempre uma pergunta a ser feita antes de colocar em prática: O plano tira os ciclistas da rua? Se a resposta for sim, o projeto provavelmente merece um não”, diz Kriston Capps, do CityLab.
Veja os projetos polêmicos de Londres: