Mudanças são tão necessárias quanto doloridas
Moradores do bairro de Santa Cecília entendem que as ciclovias que estão sendo implantadas nas ruas do bairro ferem seus direitos.
Moradores do bairro de Santa Cecília entendem que as ciclovias que estão sendo implantadas nas ruas do bairro ferem seus direitos.
O fato foi registrado em BO no 77 0 DP de Polícia, apoiados pelo Conseg, o Conselho de Segurança do Bairro, a população quer o debate – o que é bom – mas também justificam-se pois perderam as “suas” vagas para estacionar os seus automóveis. “A população é idosa e tem dificuldade de locomoção” me argumentou Fábio Fortes, presidente do Conseg.
Não existe constituição no mundo que garante o direito a estacionar carros particulares em vias públicas, portanto o único direito aí que se pode reclamar em algum BO é justamente o da retirada de objetos particulares locados em espaço público, para fomentar a livre circulação pelo bairro, desses cidadãos que têm dificuldade de locomoção e consequentemente melhorar a vida de todos.
É o paradoxo de sempre. O mesmo veneno para combater o mesmo problema causado pelo próprio veneno! Não dá certo!
Arte de Reynaldo Berto
Explico: O espaço público é limitado, os carros particulares espaçosos, pesados, poluidores, danosos a saúde e ao meio ambiente. Todos sabemos disso. Quem só vai de carro perde a mobilidade, fica doente, sem agilidade, com problemas de locomoção e tendem a acreditar que só o fácil acesso aos carros irá salvá-los.
A população não faz essa correlação, estão com dificuldade motora justamente porque não se locomovem, são sedentários, doentes pois só vão de carro.
É visível o quanto o paulistano sofre dessa epidemia – o sedentarismo. Eles pedem mais desse veneno para “sarar” seus problemas.
Não gosto de buscar exemplos fora de nosso país, mas na Europa é uma delícia ver aquelas senhoras saltitantes, beirando os 90 anos, indo e vindo a pé, subindo e descendo ladeiras e escadas de vilas histórias, sempre rindo carregando as compras para casa.
A saúde dessa população é garantida justamente pelo fato de andarem a pé todos os dias um pouco.
“Eu não invisto na doença, eu invisto na saúde, por isso faço ciclovias na minha cidade” é o que diz Victor Lippi, médico sanitarista, ex-prefeito de Sorocaba pelo PSDB. Em dois mandatos Lippi mudou a cara da cidade.
A população de Santa Cecília está repetindo o que qualquer um faz frente a mudanças; repelir. É da natureza do ser humano. Eles também pedem um debate, e isso é bom, é mesmo muito bom.
Mundialmente a circulação de carros vem sendo retirada para dar espaço a pedestres e ciclistas, apoiados por um sistema eficiente de transporte público. É o resgate do espaço público, hoje privatizado para dar espaço a veículos particulares.
Essa regra é mundial e já é Lei Federal Brasileira, garantida pela
Política Nacional de Mobilidade Urbana, a lei N0 12 587 de 3 de janeiro de 2012. A lei é clara a prioridade é do transporte público e dos “não motorizados” (Art.6 itemII) (detesto ser chamada de “não qualquer coisa”).
Veja aqui a íntegra da lei:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12587.htm
Esse modelo também beneficia o comércio, uma vez que as fachadas das lojas ficam visíveis e acessíveis. Carros obstruem a visibilidade e a entrada de clientes. Isso é fato comprovado, outro fato é que pedestres e ciclistas efetuam compras por impulso. Aumentos de vendas aconteceram em Copenhague, Paris e Londres.
Em Seul, Coréia, em 1999 o então prefeito Lee Myung Bak, derrubou um viaduto estilo “Minhocão”, esquematizou a circulação de veículos, retirou o asfalto e resgatou o rio sagrado Cheonggyecheon que estava enterrado há décadas. Durante o processo foi execrado pela mídia apoiada e patrocinada pelos comerciantes que o crucificaram.
Pois bem, finda a obra, a região atraiu uma enorme quantidade de pedestres, aumentaram as vendas a procura por turistas e o prefeito acabou eleito presidente.
São Paulo precisa mudar e o processo de mudança é sempre doloroso e o quanto mais rápido melhor. Vamos ao debate, mas com a premissa que o espaço das ruas é público e o automóvel um bem particular.