Feliz Ano Velho ou Política, seus caminhos e porteiras!
A UCB, União de Ciclistas do Brasil, foi convidada pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio para participar da Audiência Pública chamada pelo Deputado Federal Mandetta.
A UCB, União de Ciclistas do Brasil, foi convidada pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio para participar da Audiência Pública chamada pelo Deputado Federal Mandetta sobre o Projeto de Lei (PL) do Vale Transporte (VT) de Bicicleta, que, se for aprovado, pretende dar a opção ao trabalhador de receber parte de seu VT para comprar uma bicicleta para ir ao trabalho.

Brasil tem índices parecidos a Holanda em relação ao uso da bicicleta. / © Arturo Alcorta
Política começa em casa. Depois de uma boa quantidade de troca de mensagens na lista de discussão da UCB se chegou a um consenso sobre o texto a ser apresentado em Brasília: o valor do Vale Transporte em relação ao custo de uma bicicleta decente, a qualidade da bicicleta, necessidade de estrutura para receber o empregado na empresa, possibilidade de compra de equipamentos de segurança, compra de uma segunda bicicleta, forma de implantar o programa…
A primeira apresentação era voltada para dar uma visão geral de como está a questão da bicicleta no Brasil, mas Claudio Silva, que trabalhou no Semob, Secretaria de Mobilidade, do Ministério das Cidades, recomendou que a apresentação fosse focada somente nos comentários, ajustes, críticas e possíveis exclusões do texto do PL, o que parece óbvio, mas não é tão óbvio assim. Também pediu cuidado com o tom da exposição, lembrando que o importante é que a UCB volte a ser convidada para futuras Audiências Públicas. Este PL tem muitos buracos e problemas, e sua validade é discutível, quase duvidosa, mas com as discussões ficou claro que se tratava de uma boa oportunidade para posicionar a UCB no cenário político.
Apresentação pronta bem na reta final, acordar cedo, ir para o Aeroporto de Congonhas sabendo dos perigos de deixar a bicicleta estacionada no para-ciclo de lá, tomar um café da manha com preço de assalto a mão armada, embarcar num avião lotado que não conseguiu decolar por congestionamento na pista de decolagem, desembarcar em Brasília atrasado, ser colocado num carro oficial, chegar na Câmara dos Deputados, engolir um almoço no restaurante precário de lá, voltar para a sala da Audiência correndo e encontrar… ninguém; sala praticamente vazia. Só apareceram os funcionários necessários para o funcionamento da audiência, talvez um ou dois assessores silenciosos, e num canto, sentado e quieto, o Deputado Mandetta, que conduziria os trabalhos. A audiência quase foi suspensa, mas a pedidos fomos os dois, eu e Mandetta, para a mesa, o que por um lado foi bom, muito bom. Com a ausência dos outros convidados pude fazer a apresentação foi completa, incluindo a situação da bicicleta no Brasil, e esta impressionou a todos, até os sonolentos.
A ausência dos outros convidados para o debate, dentre eles a ANTT, Agência Nacional de Transportes Terrestres. Normal, pode ser considerada absolutamente normal. Bicicleta é pauta do dia, ou ‘puta’ do dia, como escrevi antes. Puta seria o melhor termo para a nossa situação. Bicicleta é moda. Política para a bicicleta e ciclistas? A “bancada da bicicleta” ou “bancada da ciclovia” da mesma Câmara Federal também não deu as caras. “Quem?” O pessoal da bicicleta ou da ciclovia? Indústria ou construção civil? Política para quem? Que política? “Nossa! bicicleta é bacana!…” Tem muito arrivista ai.
O que despertou todos na apresentação da UCB foram os dados que mostram que a bicicleta já existia no Brasil antes da classe média começar a pedalar. Mais: que o veículo mais usado no Brasil é a bicicleta e que em várias partes temos índice de uso semelhante à Holanda.
A verdade é que tirando uma meia dúzia, a maioria dos políticos não faz a mais remota ideia do que é uma bicicleta, de como se faz seu uso, de quem são os ciclistas, de como está a cidade, o trânsito. “O trânsito está ruim” não é resposta. “A bicicleta traz muitos benefícios” também não. “O ciclista corre perigos” muito menos. A discussão política sobre a bicicleta e sobre transporte é feita numa pequena tábua rasa e pobre. O discurso é simplório, imediatista, individualista e, pior, ideológico, muito ideológico, mas ideológico com forte viés de inocente útil.
Em nome da democracia está se destruindo a democracia. Falar com seriedade sobre política para a bicicleta é entrar em detalhes chatos, enfadonhos, mas que são urgentemente necessários e que a imensa maioria dos políticos, funcionários públicos e do judiciário, e principalmente a população, pensam ser minúcias. Desculpem, mas o buraco é muito mais em baixo.